Popularmente chamadas de
"tabuleiros costeiros", as terras planas do sul de Alagoas viraram
uma espécie de "ilha" em meio às acidentadas áreas que abrigam os
canaviais do Estado. É uma das poucas regiões nordestinas onde a cana pode ser
plantada e colhida com máquinas. Ainda que com algum atraso em relação ao
Centro-Sul do país, a mecanização nessa região começou a avançar em ritmo mais
acelerado, promovendo uma redução de custos de cerca de 20% em relação à
colheita manual. Além do solo plano, o uso de máquinas ganhou impulso
no sul alagoano porque as usinas agora estão conseguindo vender um subproduto
que antes virava cinzas no canavial: a palha. A monetização desse insumo está
financiando a compra de máquinas e ajudando a restabelecer o dinamismo do segmento
sucroalcooleiro estadual - que, apesar de menos pujante do que o de São Paulo,
por exemplo, representa um terço do PIB alagoano. Como dispensa a queima do canavial, a colheita
mecânica mantém intactas milhares de toneladas de palha no campo. Somente no
sul de Alagoas, o potencial de colheita dessa biomassa é de 1,5 milhão de
toneladas. Antes sem valor de
mercado, essa palha está sendo vendida para a produção de etanol de segunda
geração - o chamado celulósico - da primeira fábrica do gênero do Brasil,
construída pela GranBio, holding da família Gradin. Há dois anos, o
empreendimento começou a comprar essa biomassa na região. Inicialmente, da
usina Caeté, do tradicional Grupo Carlos Lyra. Hoje, já são quatro unidades
parceiras. A mecanização era imprescindível
para a sobrevivência desse segmento, mas a criação de um mercado que paga pela
palha ajudou a acelerar esse processo, analisa Sérgio Godoy, que gerencia a
área de matéria-prima da usina da GranBio, batizada de Bioflex 1 e situada em
São Miguel dos Campos, no sul de Alagoas. O mercado estima que, na média, 40% dos canaviais dos tabuleiros
alagoanos estão sendo colhidos mecanicamente - percentual que sobe para entre
50% e 60% no grupo de usinas que estão conseguindo vender a palha para a
GranBio. São percentuais ainda baixos, se comparados aos mais de 90% de
mecanização no Estado de São Paulo, por exemplo. Mas também estão bem acima do
uso pontual de máquinas na Zona da Mata alagoana, onde a topografia acidentada
limita o uso de máquinas a 20% dos canaviais. Os contratos de compra e venda da palha seguem
diferentes formatos, mas poucas condições são reveladas pelas empresas
participantes que assinaram com a GranBio cláusula de confidencialidade. Em
linhas gerais, o impacto no faturamento bruto é pequeno, mas quando se
considera a margem, o efeito é mais significativo, pois se trata de uma geração
de caixa livre, vinda de um produto que antes era descartado pela usina.
Esse pagamento pela biomassa, em alguns dos contratos, está sendo feito por
meio de "financiamento" de máquinas. A GranBio compra a frente de
colheita (colheitadeira, transbordo, etc) e fornece os equipamentos às usinas
parceiras em forma de comodato. No longo prazo (acima de cinco anos), as usinas
"pagam" o "financiamento" com a entrega da palha. Após esse
período, o maquinário é amortizado e passa a ser ativo da unidade parceira.
Essa foi a forma como a usina Triunfo,
localizada no município alagoano de Boca da Mata, conseguiu, enfim, fazer
deslanchar a colheita mecanizada. As primeiras tentativas de mecanização
começaram em 1991 e, depois de muitos tropeços, um índice de colheita com
máquinas de 35% do canavial foi alcançado quase 20 anos depois, em 2010.
O maior impulso, veio mesmo nos últimos três
anos, conta o diretor de operações da usina, Paulo Roberto Lira. Na temporada
passada, a 2013/14, esse percentual já havia alçado 45% com o início da
parceria com a GranBio. Neste ciclo 2014/15, já está em 55%. Atualmente, a
frota da Triunfo é de 12 frentes de colheita. Quatro são próprias, quatro
alugadas e quatro fornecidas pela GranBio em sistema de comodato.
O "financiamento" com a parceira será
amortizado ao longo de sete anos de fornecimento da palha, conta Lira. Após
esse período, a máquina entra oficialmente na planilha de ativos da Triunfo.
Dona de 12 mil hectares cultivados com cana no sul alagoano, a usina
sexagenária fornecerá, por ano, cerca de 70 mil toneladas dessa biomassa à
GranBio. O volume tende a aumentar nos próximos ciclos. O plano, afirma Lira, é
no ano que vem adicionar mais quatro colheitadeiras à frota, elevando a 16 o
número total. Como fará isso, a empresa vai definir nos próximos meses. Mas o
grupo estuda três alternativas, entre elas, a ampliação da parceria de venda de
palha. "É um grande negócio. Cem por cento desse material ficava no campo,
sem destinação". O acordo com
a outra usina parceira, a Seresta, de Teotônio Vilela, obedece à mesma lógica.
A unidade começou a vender palha nesta safra 2014/15. Duas frentes de colheita
financiadas pela GranBio já foram incorporadas à frota, formada ainda por cinco
próprias e três alugadas. Com
isso, o nível de mecanização da colheita da Seresta, atualmente de 50% da área,
vai subir no próximo ano para 70%, com a entrada de outras três frentes na
frota, diz Elias Brandão Vilela, diretor superintendente da unidade. "Até
então, a gente colocava fogo nessa palha. A parceria é uma oportunidade para
quem quer mecanizar, sem ter que se endividar", diz Vilela. Além das restrições ambientais, cada vez mais
iminentes de colocarem um ponto final na queima da cana no Nordeste, a adoção
da colheita mecanizada tem como pano de fundo a redução de custos e encargos
com trabalhadores rurais, cada vez mais escassos na região. A colheita com máquinas custa de 12% a 20% menos do
que a feita com a contratação de bóias frias, segundo cálculos das usinas
locais. "Isso sem contar que não se encontra mais cortadores de cana para
trabalhar na região. Essa mão de obra vem envelhecendo e os mais novos buscam
os programas sociais do governo para sobreviver", diz Vilela – ASCOM.
Nenhum comentário:
Postar um comentário